segunda-feira, 14 de abril de 2014

A colaboração de um (bom) livro na educação

No último sábado meu filho não queria ir dormir. Eu já tinha seguido a rotina do sono dele, que normalmente ele segue direitinho e vai para a cama sem reclamar, mas nesse dia não tinha jeito. O horário dele dormir já tinha passado e muito, ele estava morrendo de sono e o jeito que encontrei foi pegá-lo no colo e levar para a cama. Mas ele não queria ficar na cama, chorava sem parar. Ofereci contar história, cantar, mas ele não queria nada, só chorava. Até que eu perguntei para ele se ele lembrava do Chico...

Não dá para continuar a história sem apresentar o Chico para vocês. Chico é o personagem principal do livro "Chico - o valente", da Jaqueline Miotto Zolet.


O Chico é um menino que quer ser melhor a cada dia. Mas um dia ele chega em casa muito cansado e um pensamento ditador invade sua casa mental! Esse pensamento faz que ele peça tudo gritando e chorando. Seu pai vai com ele para o quarto para ajudá-lo a se acalmar e lá ele trava uma luta contra esse pensamento que está acabando com o ambiente mental de sua casa. Enfim ele vence essa luta e o livro acaba com um abraço na mãe e um delicioso lanche em família. Bem, esse é só um resumão do livro, tem muito mais coisa nessas poucas páginas.

A princípio esse livro nem seria para a idade do meu filho, mas esse livro faz parte da coleção que comprei para ele antes dele nascer. Ele houve o que estou lendo, mas em algumas páginas ele quer virar antes que eu termine de ler. Diversas vezes eu li essa história resumindo-a para que ele pegasse a essência do livro. Mas o livro está lá, sempre ao alcance dele e ultimamente está entre os seus preferidos. Ele se identifica com o Chico, muitas vezes fala que o personagem é ele. Fica impressionado na página que o Chico está gritando, sempre me dá um abraço quando chega na página que o Chico abraça a mãe e adora ficar vendo tudo que tem na mesa do lanche do final do livro.

Agora, voltando à história, eu perguntei se ele lembrava do Chico. Eu fiz essa pergunta e ele parou de chorar imediatamente! Não, eu não estou a exagerando, eu fiz a pergunta e ele parou de chorar. Ele bateu no peito, como quem diz que o Chico é ele. Perguntei se ele era valente e que pensamentos ele queria deixar entrar na casa mental. Depois disso ele deitou e dormiu. Eu realmente não esperava que seria tão simples, não sabia o quanto meu filho estava se identificando com aquele personagem, mas sou imensamente grata a Jaqueline, a Marlowa (a ilustradora do livro) e a todos me de maneira direta ou indireta colaboraram para que eu tenha essa livro em casa.

Lógico que essa atitude do meu filho não foi algo isolado, um passe de mágica. Diversos livros dele e nossas conversas o orientam para que ele veja a si mesmo, identifique seus pensamentos. Isso foi resultado da educação que eu tento dar para ele, sempre com muito afeto e respeito. Mas esse livro colaborou para que sua mente infantil encontrasse uma solução para aquilo que ele estava vivendo, eu tive apenas que recordá-lo.

Outra coisa que percebi foi a importância da história dos livros que ele tem. Esse livro mostra algo da realidade da criança, situações pelas quais ela passa. Também estimula que ele seja o protagonista, que enfrente as situações e não fique esperando o "super-herói" ou "príncipe encantado". Ele tem também livros com animais, com poesias, livros de pop-up que ele adora, mas não mais nem menos do que os que mostram a sua realidade de criança.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A história de um tapa


Meu filho levou um tapa...

O primeiro pensamento que pode vir é "normal, isso acontece entre crianças" ou "é fase". Mas não, o tapa não foi de uma criança.

Então foi um "tapinha corretivo" dos pais, né? Poderia dar justificativas do tipo "precisa corrigir mesmo". Ou eu poderia postar como uma confissão, um arrependimento, mas estaria tentando mudar.

Mas o tapa não foi dos pais. Foi um "tapinha corretivo", um reflexo de uma pessoa muito próxima. Mas antes de dar espaço ao pensamento "que absurdo", tente entender a situação...

Foram dias agitados de muito calor e pouco sono. O resultado, como era de se esperar, foi uma criança agitada que começou a morder, bater, beliscar. Num desses beliscões a autora do tapa estava do lado. O tapa foi um reflexo, um instinto. O arrependimento foi imediato, mas o tapa estava dado. Mas o reflexo não foi ao beliscão, foi um reflexo da educação.

Essa pessoa, assim como eu, foi criada com tapas. Não, nunca fomos espancadas, mas bater era uma forma válida de corrigir a criança. Era uma forma válida por ser a única que nossos pais conheciam. Minhas avós criaram meus pais com tapas (e às vezes mais do que isso) e provavelmente as gerações anteriores também utilizaram a violência para conter a energia de uma criança quando os pais estão cansados. Na minha pré-adolescência eu também dei um tapa... Eu bati numa priminha (ela devia ter a idade que meu filho tem hoje) porque ela me bateu. Levei uma bronca, mas demorei muito para entender que a lógica era que a mãe pode bater para corrigir, os outros não. Lógica?! Enfim, aprendi que é assim que o mundo funciona. O processo que realizei para finalmente descobrir que era possível educar sem violência não foi curto e só se completou quando brotou em minha vida o amor de mãe. A pessoa em questão ainda não completou esse processo, embora tenha certeza que quando ela tiver seus filhos vai saber educá-los sem violência. 

É muito duro para mim ver a indignação, a intolerância com mães que ainda batem nos filhos. Penso que se eu tivesse tido filhos mais cedo eu seria uma dessas mães. Sei que há muitos que defendem as palmadas, mas prefiro confiar que eles não são a maioria. Há muitos que se calam, que batem em seus filhos e ainda sentem o coração apertar, que querem educar e não conhecem outra alternativa. Meu marido nunca apanhou e vi que para ele foi muito mais difícil "engolir" a situação relatada. Mas se estou aprendendo a ser compreensiva, tolerante, paciente com meu filho posso aprender a levar isso para a minha vida toda.

Naquele mesmo dia, mais tarde, essa pessoa veio até mim pedir desculpas. Ela disse que não sabia se saberia ser uma mãe "tão boa" quanto eu, se saberia segurar esse reflexo de bater. Penso que sou mãe e como tal não sou melhor ou pior que ninguém. Eu devo ser "tão boa" como pessoa e só o serei se souber passar a outros o bem que recebi, principalmente se os outros forem crianças que poderão se ver livres de tapas de qualquer natureza. Ainda quero viver o dia que todo ser humano será tratado como ser humano, que todos serão vistos como pessoas sujeitas a deslises, influenciadas por pensamentos, mas que em sua essência são boas e querem o bem.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Um lugar feliz

São 2 países...

Num deles há um governante. Ele até não é a simpatia em pessoa, mas conseguiu se eleger por suas ideias. E seu mandato corre bem! Um tempo atrás houve algumas manifestações, o povo reivindicava melhorias. Não demorou muito e essas melhorias vieram. As manifestações seguintes tornaram-se pacíficas. Bem, ele foi muito criticado pela mídia internacional na época das primeiras manifestações e essa imagem prevaleceu em muitos países. Esse país tem uma constituição que defende a liberdade, a igualdade, a dignidade, a democracia e esse governante a respeita acima de tudo. Aliás, pouco tempo atrás foi convocado um referendo sobre uma questão polêmica, era necessário saber o que o povo pensava. Certo, é difícil agradar todo mundo... Às vezes ele é criticado por investir mais num setor do que em outro, assim como às vezes é preciso tomar decisões de acordo com a situação, mesmo que não seja a decisão mais popular. O que se percebe neste governante é amor por seu país, por seu povo.

Em outro país também há um governante. Seu sorriso fácil o ajudou a chegar ao poder. Esse país tem uma longa tradição patriarcal e isso se percebe nesse governo. Esse país está passando por uma delicada crise política. As manifestações são frequentes e é preciso utilizar a força policial para contê-las. Ultimamente tem-se evitado utilizar a violência, mesmo assim a cada manifestação muitos são presos. A justiça nesse país é lenta e essas prisões muitas vezes acabam se prolongando. Parte da população tem medo de se manifestar, mesmo não concordando com o governo. A constituição neste país é fraca, o que muitas vezes colaborar para os mandos e desmandos deste governante. O que se diz é que ele ama o poder e faz tudo para mantê-lo.

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Imagine-se morando em cada um desses países. Em qual deles pensa que seria mais feliz? Acho que são poucos os que, já tendo experimentado a democracia, escolheriam viver num regime autoritário, certo?

Sendo este um blog sobre maternidade, você já percebeu onde quero chegar? Pense no país como uma família, nos governantes como os pais, no povo como os filhos, nas manifestações como "birras", na constituição como os valores nos quais a família se baseia. Volte, leia as imagens novamente. Coloque a si mesmo na imagem do governante, coloque a si mesmo na imagem do povo.

É fácil falar que manifestantes de uma causa que você não concorda devem ir presos ou apanhar. Também é fácil falar que criança birrenta deve ficar de castigo ou apanhar. Mas imagine se a manifestação é pelo direito ao voto, o que a birra é por que a criança está com fome e não sabe como dizer isso. Ainda merecem ir presos, ficar de castigo ou apanhar? É fácil falar mal dos governantes, mas eu aceito rever minha forma de "governar"?

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Como agir?

Estava lendo um texto que falava de um país onde os castigos físicos foram proibidos e o resultado disso na educação das crianças. Esse tipo de texto gera polêmica, de um lado quem é a favor das palmadas dizendo que tem que apanhar para ser uma pessoa de bem, do outro quem é contra falando que é possível educar sem bater. Esse tema tem mexido comigo, principalmente depois que me tornei mãe. Eu não quero bater em meu filho (e acho que ninguém quer, só bate por não ver outra alternativa), mas também não quero ser permissiva, deixar que meu filho faça tudo e não tenha limites. Então comecei a pensar em situações que normalmente as crianças apanham e a fazer analogia com situações que os adultos passam:

1.1 Seu filho está brincando de correr pela casa, você pede para ele parar, ele não obedece. Pouco depois ele bate a cabeça na quina da mesa. Como agir?
a) Dar um tapinha na mesa dizendo "Mesa boba, não faz assim com meu filho".
b) Dar um tapinha na criança dizendo "Eu te avisei para não correr! Da próxima vez vê se me obedece!"
c) Acalmar a criança e mostrar para ela que a mesa estava ali, que ela deve tomar cuidado para que não aconteça novamente

1.2 Alguém está dirigindo em alta velocidade, passa num sinal vermelho, bate o carro e se machuca. Como agir?
a) Dar um tapinha no carro dizendo "Carro bobo, por que não freou sozinho?"
b) Dar um tapa no motorista dizendo "Você sabe que não pode correr e passar no sinal vermelho! Aprendeu agora?"
c) Verificar o estado do acidentado, ajudando-o a sair do carro ou chamando atendimento. As autoridades/seguro do automóvel vão verificar quem foi o responsável que terá que arcar com o prejuízo.

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2.1 Seu filho está brincando de bola dentro de casa e você pede que ele vá brincar lá fora. Nesse instante a bola bate num copo que cai e quebra. Como agir?
a) Juntar os cacos, tirar tudo que quebra de perto e deixar a criança brincando.
b) Dar um tapa na criança e mandá-la para fora enquanto você junta os cacos.
c) Trazê-la para perto do copo, mostrar o que acontece ao brincar de bola dentro de casa. Se tiver idade, pedir que ajude a limpar a bagunça depois dar a opção de brincar de bola lá fora ou brincar de algo mais calmo dentro de casa.

2.2 Seu colega de trabalho se anima contando uma história e num gesto mais animado bate num copo que cai e quebra. Como agir?
a) Limpar a sujeira, tirar tudo que quebre de perto dele e nunca mais lhe oferecer algo em um copo de vidro.
b) Bater nesse colega dizendo que ele é um idiota desastrado.
c) Ajudá-lo a limpar a sujeira. Foi um acidente e certamente seu colega evitará que aconteça de novo.

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3.1 Você chega cansado do trabalho e se filho está brincando animado. Quando ele começa a fazer barulho de carrinho e passar com o brinquedo por cima de você sua cabeça começa a latejar. Como agir?
a) Aguentar a dor e esperar que ele resolva brincar de outra coisa.
b) Bater nele e mandá-lo para o quarto, isso não é hora de fazer bagunça!
c) Respirar fundo, tomar um remédio para a dor e sugerir uma brincadeira mais calma, talvez um jogo que você possa participar também e ele possa ter a sua atenção. Andar de bicicleta pode gastar mais as energias e assim ele vai dormir mais cedo!

3.2 Depois de uma semana agitada você resolve aproveitar o sábado de sol num parque. Senta sob uma árvore e começa a ler um livro. De repente um grupo de amigos se reúne na proximidade para um piquenique começa a conversar e rir. Como agir?
a) Ir embora, mal humorada.
b) Chamá-los para uma briga, onde já se viu fazer tanto barulho!
c) Respirar fundo e procurar nas redondezas uma sombra calma para você continuar sua leitura. O parque é público, todos tem o direito de aproveitar um dia de sol. 

Bem, penso que é óbvio que as respostas "c" são as mais adequadas. Nas situações em verde (com estranhos, colegas de trabalho, adultos), se eu tomar uma das atitudes das respostas "b" serei considerada louca, se escolher a resposta "a" passarei por boba. E por que as atitudes "a" e "b" são aceitas quando se trata de crianças? As situações são bem parecidas... Entendo que a criança precisa ver as consequências de seus atos, saber o que está acontecendo, não devo protegê-las ou jogar a culpa nos outros (situação "a"). Mas também precisam entender a situação, aprender a fazer escolhas, um tapa mostra simplesmente que não pode fazer aquilo naquela hora, o que não vai impedir de errar em outra situação. Pode até ser que a criança pare de fazer bagunça, mas por medo de errar de novo e toda criança deveria ter o direito de ter alguns momentos de bagunça.

Vejo que sempre terei opções quando se trata da educação do meu filho. Se souber manter a serenidade e pensar poderei escolher a alternativa que a longo prazo trará melhores resultados. Escolhendo a opção errada, seja ela a permissividade ou o tapa, correrei o risco de ter em casa mais um "pequeno tirano", que pode tudo ou se revolta contra tudo.

Já experimentei conversar com meu filho quando ele tem atitudes inadequadas. Sei que ele ainda entende pouco, mas é muito esperto. Aos poucos ele está desenvolvendo a noção de certo e errado, está conhecendo seus limites e percebendo o que me agrada. Peço àqueles que convivem com ele que observem isso também e, quando ele tiver uma atitude "errada", identifiquem o que a causou, principalmente se não foi sua conduta que a estimulou.


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Não leia este post!

Ahá! Você está lendo! Talvez seja por curiosidade ou por teimosia. Mas se você não obedeceu a "ordem" do título do post, por que uma criança deve sempre obedecer uma ordem?

Então vou mudar um pouco minha ordem: este post é sobre educação infantil, só leia se você tiver interesse. Pode ser que muitos parem por aqui, outros ficarão ainda mais interessados, mas você teve uma escolha.

Meu filho ainda é pequeno, é o primogênito, mas estou fazendo meus ensaios em sua educação. E tenho refletido muito sobre os nãos que ele precisa ouvir. É óbvio que tenho que falar muitos não para ele, mas busco ter um tom e uma explicação para cada um deles. Percebo que há algumas categorias de não:

- Não é não. Esse é do tipo que não dá para questionar, o que não quer dizer que não precisa de explicação. Uso principalmente para coisas perigosas como mexer no fogão quente, ir em direção a uma escada, debruçar na janela. Procuro evitar esse tipo de não, que normalmente tem um tom mais ríspido, principalmente quando está acompanhado do susto. Evito com dispositivos de segurança, até por que não é bom arriscar.

- Regras da casa. Esse é resultado de muito exercício. Um exemplo desse não é não deixar brinquedos jogados pela casa. Eu gostaria que os brinquedos não estivessem jogados, meu marido também, seria bom que meu filho começasse a entender isso. Busco que esse tipo não cause estresse, sei que vai precisar de muita repetição. Também evito usar a palavra não, prefiro sugerir que a gente guarde os brinquedos juntos. Mas é um não que ele precisa ir entendendo, já que as regras não existem só na minha casa. Também deixo coisas minhas não perigosas ao alcance dele, para ele saber que há coisas que estão ao alcance dele mas que não são brinquedos. Acho isso importante para ele não sair mexendo em tudo quando vamos visitar alguém.

Escolhi fazer bagunça!

- Gostaria que você não fizesse isso. Aqui eu procuro deixar bem claro que é a minha vontade (deixar claro para mim e para ele). Eu gostaria que ele não virasse o balde com o joguinho de várias peças, que não brincasse com o brinquedo barulhento, que não batesse um brinquedo no outro. Mas isso é o que eu quero, às vezes só naquele momento. Se ele fizer não haverá dano algum, a não ser na minha paciência. Ele não é meu robozinho, não tem a obrigação de fazer o que eu quero. Se é esse o caso, procuro sugerir outra brincadeira, pode ser que dê certo. Se não dá certo o melhor é ficar na minha, sem perder a paciência. Se perder a paciência, mordo meu dedo, bato com a cabeça na parede ou me viro de qualquer jeito que não envolva ele, já que a deficiência é minha e a culpa não é dele.

- Agora não. Esse é o que eu tenho mais dificuldade. Ele pode brincar lá fora, mas não de noite ou quando está chovendo; ele pode jogar bola, mas não na hora de dormir. Aqui entra muita explicação, mas novinho do jeito que é, ainda é difícil entender. Daí tem choro, tem bico, mas ele precisa entender que não dá para fazer tudo na hora que quer. Tento fazer algumas coisas (como o jeito de dormir) numa certa rotina para facilitar seu entendimento, mas sem rigidez, observando sempre o melhor para ele. Se seu entendimento ainda não está desenvolvido é minha responsabilidade conduzi-lo e aos poucos ele deve começar a entender...

A partir do momento que deixo claro que tipo de não estou usando começo a dar liberdade de escolha para meu filho. Espero que ele seja um rapaz colaborador, que faça o que eu sugiro, mas, mais que isso, quero que ele seja capaz de decidir o que é melhor para ele. Oferecendo para ele oportunidades de escolha a todo momento espero que ele saiba fazer as melhores escolhas quando eu não estiver por perto.

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Um tapinha (não) dói

Eu não era contra uma palmada educativa. Eu levei uns tapinhas quando era criança e não fiquei traumatizada. Eu achava que era melhor uma palmadas do que uma criança sem limites. Tudo isso no pretérito, as coisas mudam. Mas normalmente a mudança não é rápida.

Na adolescência eu saí do casulo e comecei a conhecer meus amigos. Comecei a ampliar meus horizontes e conversar com gente diferente. O assunto educação não era raro em nossas conversas, mesmo quando eu era mais nova. Não era raro e eu me interessava muito. Mesmo assim foram poucas as vezes que entramos no assunto "palmadas". Em nossas conversas sempre vi lindos exemplos e experiências, alguns falando do que viviam com seus filhos, alguns falando de exemplos que viram e anelavam aplicar. Mas nunca ouvi alguém falando "daí eu meti um tabefe naquele pirralho para ele tomar jeito" ou algo parecido. Os exemplos trazidos eram sempre positivos, normalmente resultado de muito estudo e muitas tentativas.

Foi nesse ambiente que eu fui amadurecendo. Ainda era relativamente nova e muitas vezes os exemplos que traziam serviram para que eu entendesse melhor o que os pais querem. Quantas vezes percebi amigos mais velhos complementando a educação que meus pais deram! Sei que meus pais me educaram muito bem, mas às vezes ouvir algo de outras bocas permite que a gente entenda melhor.

Mas o pensamento "uma palmadinha não tem problema" continuava em minha mente. Ele já começava a mudar, indo para um cantinho e começando a se esconder. Ele se mostrava como "só vou bater em último caso". O pensamentinho estava ficando acuado, ele não combinava com os outros pensamentos que eu estava cultivando, pensamentos de bem que se uniam para tentar fazer um mundo melhor.

Quando conheci meu marido ele deixou claro que não era a favor das palmadas. Gostei da ideia... Embora eu não fosse contra, eu também não era a favor, só achava que tinha horas que não haveria saída. Quando engravidei vi claramente que não haveria palmadas na minha família. Em mim o pensamento estava perdendo força e realmente não estava disposta a brigar por ele, muito menos colocando em risco a harmonia do meu lar. Quando o Guilherme nasceu vi que esse pensamento começou a agonizar.

O abraço mais gostoso deste mundo!

O pensamento da palmada entra em conflito com o que há de mais forte numa mãe, o amor. O Guilherme é um menino doce e inteligente (como toda criança é, mas estou relatando a minha experiência). Convivendo com essa criança encantadora eu me vi perguntando como alguém pode bater no filho. Comecei a perceber a sua compreensão se desenvolvendo, a vontade de aprender despertando e a confiança que ele tem em mim como sua perceptora. Esse pensamento já era um corpo inerte em minha mente, mas ainda não tinha decretado sua morte.

Certo dia estava lendo alguns comentários em uma página de mães numa rede social. Um delas estava com problemas com a filha, que estava querendo mandar e batendo nos outros (o que parecia ser o "terrible two") e pedia ajuda. Ao ler os comentários me assustei. A maioria recomendava a palmada como a única saída, além de ser eficaz. Mas, calma aí, será que fui só eu que percebi contradição em bater para a criança parar de bater?! E depois, nada tem uma só saída! Vi que naquela situação a palmada é a "solução" rápida, que faz a criança parar com aquele comportamento na hora ou naquele período, por medo de levar nova surra. Mas a criança não compreende onde está o errado daquele comportamento e vai repeti-lo em outra ocasião, quando levará outro tapa e quantos outros forem necessários até que consiga ver o que dispara aquele castigo tão severo. Vi que a palmada é a saída para quem não tem outros recursos, para quem não tem paciência. Só que eu sei que tenho recursos, sei que posso cultivar a paciência, sei que posso ser uma mãe cada vez melhor. E nesse instante enterrei sem dó nem piedade aquele corpo inerte que atravancava minha mente.

Depois desse dia já passei algumas situações difíceis com meu filho. Ele eventualmente tem crises de choro e não tenho a menor ideia do motivo. Um delas foi de madrugada, no meio da semana. Ele berrou por mais de uma hora. Durante a crise eu tive vontade de berrar junto, bater com a cabeça na parede ou qualquer coisa que fizesse aquilo passar. "Coincidentemente" era isso que meu filho queria fazer também, percebi que ele estava sentindo mesmo que eu. Eu não compreendia pois a situação não era comigo, ele não compreendia por que ainda não tem condições de compreender algo assim. E vi no meio do desespero surgir em mim a tolerância, algo que certamente não aconteceria se optasse por um tapa (que com certeza pioraria a situação). Tirar esse pensamento da minha mente está permitindo que eu seja melhor, que eu encontre a forma de despertar em mim as melhores virtudes, que eu faça a alquimia de transformar o mal em bem.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Sacrifícios

Você já pensou quais sacrifícios está disposto a fazer? Não, a pergunta não é se está disposto a fazer sacrifício, não fazê-los não é uma opção...

Quando nos tornamos mães estamos abrindo mão de várias coisas. Começa ainda na gravidez com o seu bem-estar, com o seu corpinho de miss, com o choppinho no fim de semana. Depois sacrificamos as noites de sono, as viagens, as saídas com os amigos... Cada caso é um caso, mas todo mundo precisa sacrificar algo. Pode ser, por exemplo, que você não tenha sacrificado a saída com os amigos, que você leve seu bebê ao barzinho ou à casa dos amigos e entre a madrugada batendo papo com eles. Mas provavelmente vai sacrificar a sua disposição no dia seguinte, ou pelo menos o tempo da manhã que vai ficar dormindo enquanto seu filho fica com a babá. Pode ser que para você abrir mão de dormir até as 10h no domingo não seja nada, assim como pode ser que você queira morrer quando seu filho te chama às 6h da manhã.

Mas não é só como mães que precisamos aprender a fazer sacrifícios. Vou dar outro exemplo: digamos que você começou a engordar nos últimos anos. Algo será preciso sacrificar... Pode ser que baste cortar o açúcar do café, ou que você precise dedicar algum tempo para ir à academia. No começo o sacrifício pode ser pequeno, mas sem ele a situação pode ficar cada vez pior, aqueles poucos quilos por ano vivarão muitos depois de 10 anos. Esses muitos quilos podem acabar com a sua saúde e no final o sacrifício pode ser uma cirurgia ou mesmo uns anos a menos de vida. E isso acontece em todos os âmbitos da vida.

Um amor que fez a vontade de querer
um mundo melhor ser mais urgente.

E por que falar disso num blog sobre maternidade?

Se já é certo que teremos que abrir mão de algumas coisas, não é melhor fazer isso conscientemente? Hoje eu penso no que estou sacrificando e em prol de que? Algumas coisas não temos muita opção, como passar a noite em claro quando o filho está doente. Mas na forma de educá-lo eu posso escolher. Posso escolher dedicar um tempo ao meu filho, conversar com ele quando faz algo errado, pensar e repensar como estimular ou corrigir alguma conduta dele, refletir sobre como as minhas atitudes refletem na vida dele. Se não dedicar esse tempo a ele eu posso escolher a palmada. A princípio pode parecer que eu não estou sacrificando nada, mas qual o sacrifício que terei que fazer no futuro? Talvez intermináveis reuniões com os professores que tentam convencer meu filho que bater nos outros não é solução, talvez sacrifique o carinho que ele tem por mim, que será substituído pelo medo, talvez sacrifique sua inocência.

Entendo que os sacrifícios são pesados quando não sei o resultado que me trarão. Eu optei por sacrificar um pouco do meu tempo ocioso para pensar. Pensar em mim e como ser melhor a cada momento, pensar no meu filho e como oferecer o melhor para ele, pensar em minhas atitudes e como elas refletem no mundo de hoje e de amanhã. Eu quero um mundo melhor e cada vez mais vejo que tenho que fazer algo para que isso aconteça. E nada melhor do que começar pelo meu mundo.

E você, quais sacrifícios está disposto a fazer?